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Não é somente a Anatomia e a Fisiologia que demonstram a identidade de composição e de funcionamento vital dos tecidos animais e humanos. E agora a experiência. Falando como Le Dantec, dir-se-á que a substância cão pode viver na substância homem e aí se adaptar perfeitamente. Melhor, ainda, eis de novo em a noção de perispirito: é o terreno, no corpo do animal, que dá aos tecidos vivos sua especialidade. Uma artéria pode ser enxertada em outro corpo e aí gozar um papel de veia, ou reciprocamente, quando substitui uma parte doente desta. Existe, pois, um plano orgânico, e a matéria viva lhe obedece, no sentido de que ela transforma sua função, caso lhe imponham viver em outro lugar, que não aquele para o qual foi organizada. Não invento nada. As experiências do cirurgião Carrel o estabelecem peremptoriamente. Eis o que ele verificou: Graças a sua técnica, o Dr. Carrel, coisa inaudita, chega a remendar muitos centímetros destruídos da aorta abdominal, com um pedaço do peritônio. E o pedaço de peritônio logo se transforma em uma parede vascular. Que futuro para a cura radical dos aneurismas! Uma cadela do laboratório do Dr. Carrel conserva, há dois anos, em lugar de uma artéria abdominal, um pedaço de artéria poplitea, tirada de um jovem, a quem acabavam de cortar a perna, e essa artéria humana funciona admiravelmente no animal. Coisa inesperada, o Dr. Carrel pode conservar, por mais de dez meses, em tubos especialmente dispostos, fragmentos de vasos, veias ou artérias, e mesmo outros tecidos, sem que a vitalidade deles seja prejudicada. São enxertados e se soldam. O curso do sangue restabelece-se em vasos, que, por tanto tempo, ficaram vazios. Assim, revivificados, adaptam-se logo às novas funções que se lhes impõem. Enfim - fato que ultrapassa tudo o que se poderia esperar, e que seria inacreditável, se não o houvesse verificado o Dr. Pozzi -, o Dr. Carrel substitui membros. Há, no seu laboratório, um cão branco e um cão preto da mesma estatura; cada um deles traz uma perna do outro. Nenhum parece desconfiar de nada; a perna preta do cão branco e a perna branca do cão preto se acham tão sólidas, tão vigorosas, tão isentas de inferioridades funcionais, como quando pertenciam, ainda, a seus antigos proprietários. (32) Vê-se, pois, que minha asserção sobre a identidade dos tecidos vivos humanos e animais é seriamente fundada, e desde que os vertebrados superiores têm um sistema nervoso semelhante ao nosso, como composição, e de disposição análoga, é pouco filosófico recusar-lhes a faculdade de pensar, quando se admite que essa faculdade está ligada ao funcionamento da célula cervical. Nós, espíritas, que temos a prova da existência independente do princípio anímico, não podemos deixar de crer que ele existe nos animais, visto que possuímos, fora das razões lógicas que nos levam a admiti-lo, certo número de fatos demonstrativos. Foi possível verificar, por vezes, em sessões de materializações, que animais defuntos reaparecem com seu antigo corpo físico, assim como foi observado à desprendimento de outros. Se tais fatos são reais, resultaria daí que há, no ponto de vista espiritual, a mesma unidade geral que a Ciência estabelece para os seres vivos. Estes são formados de células; provêm sempre de um ser que lhes é semelhante; desenvolvem-se e morrem pelos mesmos processos; têm exigências idênticas para manter a vida. Desde a origem dos tempos, as incalculáveis miríades de seres que passaram por nosso Globo, procriando ininterruptamente, transformaram-se de tão prodigiosa maneira, que os restos que se lhes descobrem parecem criações apocalípticas, posto que os órgãos e as funções tivessem sido os mesmos por toda parte; entretanto, foi a sucessão deles que nos trouxe ao ponto em que estamos, visto que não existe a geração espontânea. A Ciência formulou certo número de hipóteses, para explicar as mutações dos seres. Lamarck e Darwin imaginaram teorias sedutoras, que as de Quinton e de Vries completaram até certo ponto. Mas, a verdadeira causa da evolução deve ser procurada, segundo penso, nos esforços que o princípio inteligente tem feito para se ir desprendendo das faixas da matéria. Lamarck mostrou muito bem a força da influência dos meios para modificar os organismos; Darwin fez-nos compreender como a luta pela vida conduzia à sobrevivência dos mais aptos, dos que melhor se sabiam adaptar. As variações espontâneas não fazem mais que pôr em relevo o trabalho latente executado no seio dos organismos, e a lei de constância do meio orgânico, descoberta por Quinton, indica o esforço que os seres vivos executam para manter as condições essenciais do funcionamento vital, apesar das transformações do mundo exterior. Todas essas causas têm sido adjuvantes para polir o ser espiritual, para fazer surgirem as virtualidades que dormiam nele, a fim de que ele se torne cada vez mais apto a tomar conhecimento de si próprio e da Natureza. Em nossos dias existem, ainda, representantes de todas as mentalidades possíveis. Desde as plantas até o homem, passando por todo o reino animal, há uma série gradual e contínua, que parte da inconsciência quase total até à plena luz da razão que ilumina os homens superiores. Em lugar de ver nessa grandiosa hierarquia unidades separadas, de que cada uma seria efêmera centelha, a teoria das vidas sucessivas obriga-nos a pensar que todo ser, chegado ao ápice, passou pelas fases inferiores, e que seu desenvolvimento não é devido ao capricho de um criador, que o teria privilegiado, mas ao seu próprio esforço. Certo, a ordem, a justiça e a harmonia se introduzem na explicação da Natureza, a evolução não é mais uma sucessão de acasos felizes, mas o desenvolvimento de um plano lógico para a vitória do espírito sobre a matéria. Formação e desenvolvimento gradual do espírito Se bem que a natureza íntima do princípio pensante nos seja ainda desconhecida, somos obrigados a procurar-lhe as origens em todos os seres vivos, por ínfimos que nos possam parecer. Sem dúvida, a individualidade desse princípio não é aparente nas formas inferiores, mas há uma necessidade lógica de ver em todas as manifestações vitais uma ação desse princípio espiritual, mesmo quando ele está, ainda, indistinto nos seres que estão na base da escala orgânica, como eu o dizia na memória apresentada ao Congresso Espírita, em 1898. Somos, pois, obrigados, pela força da lógica, a buscar no reino vegetal o exórdio da evolução anímica, porque a forma que as plantas tomam e conservam durante a vida implica a presença de um duplo perispiritual, que preside às trocas e mantém a fixidez do tipo. A Natureza - diz Vulpian (33) - não estabeleceu uma linha de demarcação bem nítida, entre o reino vegetal e o animal. Os animais e os vegetais se continuam por uma progressão insensível, e é com razão que são reunidos sob a denominação comum de reino orgânico. A assimilação do papel representado pelo perispírito a um eletroímã de pólos múltiplos (34), cujas linhas de força desenhassem não somente a forma externa do indivíduo como o conjunto de todos os sistemas orgânicos, parece passar do domínio da hipótese para o da observação científica. Numa comunicação feita à Academia de Ciências, a 12 de maio de 1898, Stanoiewitch apresentou desenhos tomados ao natural, os quais mostram que os tecidos são formados segundo linhas de força nitidamente visíveis. Um deles reproduz o aspecto de um ramo de pinheiro com dois nós, que têm o mesmo papel e produzem as mesmas perturbações nas partes onde se encontram, como um pólo elétrico ou magnético introduzido num campo da mesma natureza; outro demonstra que a diferenciação se produz segundo as linhas de força; um terceiro representa a secção de um ramo de carvalho alguns centímetros acima da ramificação. Vê-se, até os menores detalhes, o aspecto de um campo eletromagnético formado por duas correntes retilíneas, cruzadas, do mesmo sentido, e sensivelmente da mesma intensidade. Essas observações parecem estabelecer a existência de um duplo fluídico vegetal, análogo ao que se observa no homem. Há, com efeito, alguma coisa nos seres vivos que não é explicável pelas leis físicas, químicas ou mecânicas; essa alguma coisa é a forma que eles apresentam. E não só as leis naturais não explicam as formas dos indivíduos, mas todas as observações nos levam a pensar que a força plástica que edifica o plano estrutural e o tipo funcional desses seres não pode residir nesse conjunto móvel, flutuante, em perpétua instabilidade, que é o corpo físico. A série animal nos vai mostrar o progresso continuo das manifestações anímicas. Passagem do principio inteligente pela serie animal Na multidão inumerável dos organismos inferiores, o princípio anímico só existe em estado impessoal difuso, porque o sistema nervoso não está ainda diferenciado; os seres são surdos, cegos, mudos: trata-se dos zoófitos; desde, porém, que ele faz sua aparição nos anelados, começam a especificar-se as propriedades comuns e vemos produzirem-se as distinções pela formação dos órgãos sensórios. A medida que o sistema nervoso adquire mais importância, as manifestações instintivas, que se limitavam à procura da nutrição, variam e apresentam uma complexidade sempre crescente. Eis, segundo Leuret, como se faz a progressão: 1- Notam-se, nos animais que parecem estabelecer uma transição com a classe inferior, instintos exclusivamente limitados à busca da nutrição (anelídeos: sanguessugas). 2- Sensações mais extensas e mais numerosas, ardor extremo pela geração, voracidade, crueldade cega (crustáceos: lagostim). 3- Sensações mais extensas, construção de um domicílio, voracidade, astúcia, artimanha (aracnídeos: aranha) . 4- Enfim, sensações mais extensas, construção de um domicílio, vida de relação, sociabilidade (insetos: formigas, abelhas). Nos vertebrados, se tomarmos sempre como base o desenvolvimento do sistema nervoso e mais particularmente do cérebro, como critério da inteligência, veremos, segundo Leuret, que o encéfalo, tomado como unidade, está em relação ao peso do corpo: 1. Nos peixes como 1 está para ............. 5.668 2. Nos répteis como 1 está para ............. 1.321 3. Nos pássaros como 1 está para ............ 212 4. Nos mamíferos como 1 está para .......... 186 Há, pois, progressão continua do encéfalo, quando passa de uma ramificação à que lhe é imediatamente superior, mas com a condição de que a pesada abrace cada grupo tomado em bloco e não tal ou qual espécie tomada separadamente. É fato hoje bem demonstrado que o progresso na série animal se realiza, não em linha reta e sobre uma só linha, mas em linhas desiguais e paralelas. Diz-se que o cérebro humano é a tal ponto desenvolvido, que nenhum ser poderá ser comparado a nós, ainda que de longe, pelas dimensões e peso do encéfalo. É verdade, mas a diferença não é tal que baste para constituir um novo reino. O cérebro de um macaco, de um cão ou de um gato representa, em seu conjunto, quase a disposição geral do cérebro humano. A anatomia comparada demonstrou, perfeitamente, a analogia das diferentes partes. Sem entrar em pormenores, basta assinalar que o anatomista que bem estudou o cérebro de um macaco conhece de maneira passavelmente exata a anatomia do cérebro do homem. As circunvoluções constituem no aparelho cerebral do ser humano - diz Richet - o elemento de maior importância; e é sobretudo pelas circunvoluções que o cérebro do homem difere do cérebro dos outros vertebrados. Entretanto, distingue-se no encéfalo do cão o plano primitivo e o esboço das complicadas e profundas circunvoluções do homem adulto. Passando do animal ao homem, o órgão se aperfeiçoa, aumenta, diferencia-se, mas conserva-se o mesmo órgão. Não nos espantemos, pois, de descobrir nos vertebrados o esboço do que será mais tarde a alma humana. Não devemos esperar ver nos animais uma inteligência ou sentimentos comparáveis em intensidade ao que se observa no homem, mas o que neles devemos encontrar, se é verdadeiro a evolução anímica, é o gérmen de todas essas faculdades. A experiência o confirma precisamente. Os numerosos estudos consagrados às faculdades animais estabelecem que neles se nota, sob o ponto de vista intelectual: a atenção, julgamento, a memória, a imaginação, a abstração, o raciocínio; uma linguagem de ação e uma linguagem de voz. Os sentimentos passionais se afirmam pelo amor conjugal, pelo amor materno, por vezes, pelo amor do próximo, a simpatia, o ódio, o desejo da vingança, a sensibilidade ao motejo. Os sentimentos morais, muito pouco desenvolvidos, podem ser observados nas manifestações do sentimento do justo e do injusto, e pelo remorso. Enfim, os sentimentos sociais se verificam entre os que vivem em tropa, por efeito de serviços mútuos, de solidariedade e mesmo de verdadeira fraternidade. Quando os animais se batem - diz o religioso Agassiz - quando se associam para um fim comum; quando se advertem do perigo; quando vêm em socorro um do outro; quando mostram tristeza e alegria, manifestam movimentos da mesma natureza daqueles que se inscrevem entre os atributos morais do homem. A graduação das faculdades morais nos animais superiores e no homem é de tal forma imperceptível que, para negar aos animais certo senso de responsabilidade e de consciência, é preciso exagerar desmesuradamente a diferença que há entre o homem e eles. (35) O capítulo seguinte nos mostrará a exatidão do sábio americano. CAPITULO IV A INTELIGÊNCIA ANIMAL Observações que parecem favoráveis à hipótese da evolução anímica. - Os cavalos d'Elberfeld. - O cão Rolf. - A cadela Lola. - Zou. Para apoiar as asserções dos naturalistas que admitem a inteligência animal, experiências do mais alto interesse foram levadas a efeito há alguns anos, principalmente na Alemanha, em cavalos e cães; elas tendem a demonstrar que nossos irmãos inferiores não se acham tão afastados de nós, intelectualmente, como vulgarmente se imagina. Vou resumir as observações publicadas a respeito dos cavalos de Elberfeld, dos cães Rolf e de Lola. Os cavalos calculadores Em 1912, a imprensa parisiense fez grande ruído em torno da publicação (36) das experiências de Krall, rico negociante de Elberfeld, com seus cavalos Muhamed e Zarif. Esses inteligentes quadrúpedes, por meio de um alfabeto convencional, podiam entreter-se com seu mestre, executar cálculos complicados, indo mesmo até à extração de raízes quadradas e cúbicas. Concebe-se que semelhantes afirmações fossem acolhidas por uma incredulidade geral. Muitos filósofos de renome, entretanto, tendo estudado o caso desses animais notáveis, perceberam que havia aí, realmente, um campo novo de observação para a psicologia animal, e publicaram numerosos relatórios nos Annales des. Selences Psychiques dos anos de 1912 e 1913, nos Archives de Psychologie de Ia Suisse Allemande e na revista italiana Psyche. Vou citar passagens tomadas nessas diferentes fontes. Elas estabelecem a certeza das notáveis faculdades desses animais. Krall não foi o primeiro que se ocupou em estudar a inteligência dos cavalos; a honra cabe a um precursor, chamado Wilhelm Von Osten, que desde 1890 acreditou perceber no cavalo Hans, garanhão suíço, sinais de uma inteligência, que resolveu cultivar. Com infatigável paciência, buscou fazer-se compreender por Hans, que se tornou capaz, não só de contar, isto é, de bater nuns trampolim, colocado diante de si, com o pé direito, o algarismo das unidades e com o esquerdo o das dezenas, como, ainda mais, de efetuar verdadeiros cálculos, de resolver pequenos problemas. Aprendeu a ler e indicar a data dos dias da semana corrente. |