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Sonhos 4(Sonhos de São Francisco de Assis) Fernando Rocha Nobre Ao longo da história de Francisco, percebemos como ele foi orientado por diversas vezes através de seus sonhos e como estas orientações sempre foram corretas. Para ele, não havia a menor dúvida de que eram mensagens de Deus e que, portanto, precisavam ser obedecidas. Parece que esta atitude, de alguma forma, influenciou o seu grupo mais próximo, a tal ponto que estes sonhavam com Francisco e seguiam as suas orientações, também. Tomás de Celano chega a dizer: “A quantos deu conselhos em sonhos, mandando fazer ou deixar de fazer alguma coisa!” É evidente que seus seguidores e mesmo a população em geral invariavelmente obedecia ao Francisco onírico. A imagem de Francisco equivalia ao próprio. A primeira orientação que Francisco recebeu em sonho ocorreu no ano de 1204, quando se alistou para a guerra na região da Apúlia, no sul da Itália. Dois anos antes, durante a guerra entre as cidades de Perusa e Assis, Francisco, então com 20 anos, foi preso e passou cerca de um ano na prisão, tendo o seu resgate sido pago pelo pai, rico comerciante. Parece que o jovem Francisco tinha um espírito aventureiro. Neste primeiro sonho, uma pessoa mostrou-lhe um palácio magnífico, repleto de armas militares. Maravilhado por aquela visão, perguntou de quem eram aquelas armas de tanto esplendor e aquele palácio tão espaçoso. Esta pessoa lhe respondeu que tudo seria dele. Francisco acordou exultante, certo de que o sonho era premonitório e que lhe revelava um brilhante futuro militar. No entanto, teve um segundo sonho (e seus biógrafos não o situaram no tempo. Sabemos, apenas, que aconteceu no caminho rumo para a Apúlia. Francisco queria muito participar da guerra) onde uma voz lhe perguntou para onde estava indo. Assim que respondeu, ouviu esta mesma voz lhe fazer uma pergunta: “A quem você pretende servir, ao Senhor ou ao escravo?” Francisco não titubeou: “Ao Senhor”. Neste momento, parece que Francisco conseguiu entender que o escravo a quem a mensagem se referia era o conde Gauthier de Brienne, sobre cujas ordens ele pretendia combater. Então, Francisco perguntou com humildade: “Que quereis que eu faça, Senhor?” A voz respondeu dizendo que deveria retornar para sua cidade e que deveria interpretar o sonho anterior de uma outra maneira, para poder entendê-lo melhor. Um outro biógrafo registra o final da mensagem desta voz de uma forma diferente. Francisco deveria retornar para sua cidade e aguardar, pois Deus iria revelar-lhe a real natureza desta mensagem. Independentemente de como foi o final desta mensagem, o fato é que esse sonho marcou o início do processo de conversão de Francisco, a tal ponto que ele despertou se sentindo um outro homem. Um Grande Sonho, na definição junguiana, tem o poder de transformar quem o vive. Tudo indica que Francisco teve um nesta ocasião. Jung assim define um Grande Sonho: “Tais sonhos são de significado muito grande para o equilíbrio psíquico do indivíduo. Muitíssimas vezes até ultrapassam o horizonte mental da pessoa e adquirem assim validade para muitos anos de vida, como se fossem marcos miliários espirituais, mesmo que jamais sejam entendidos completamente” (OC XVII par. 208). O texto completo está no encarte central da edição 16. Fernando Rocha Nobre é psicólogo junguiano e editor do Jornal SONHOS A pior ignorância "O mais sábio dentre vós, homens, é quem, como Sócrates, compreendeu que sua sabedoria é verdadeiramente desprovida do mínimo valor." Em sua defesa diante do tribunal de Atenas, Sócrates estabeleceu a distinção entre dois tipos de ignorância: a dos que sabem que não sabem e a dos que pensam saber mas não sabem. A pior das duas é esta última, pois quem conhece a própria ignorância se predispõe a aprender, enquanto quem se julga dono do conhecimento recusa-se a aprender e comete erros grosseiros ao aplicar seu falso conhecimento. Em seu célebre mito da caverna, Platão apresenta uma imagem impressionante da condição de ignorância humana: prisioneiros acorrentados de modo que só enxergam o fundo de uma caverna, sobre o qual são projetadas sombras de homens e objetos. Como passaram toda a vida acorrentados, olhando a parede, os prisioneiros tomam as sombras por objetos e pessoas reais. O mito de Platão nos faz pensar nas imagens coletivas criadas pelos meios de comunicação de massa, especialmente as imagens projetadas do cinema e da televisão. Quantas pessoas não vivem entre a rotina alienante do trabalho e as ilusões da mídia, nas quais encontram emoções e sentimentos com os quais conseguem se identificar? Sorrateiramente, as ilusões projetadas pela mídia acabam assumindo um status de realidade mais concreta e palpável do que a realidade imediata. Milhões de pessoas se emocionam com o drama do garoto abandonado mostrado pela televisão mas a maioria permanece insensível quando encontra o original no caminho de casa para o trabalho. Uma versão ainda mais radical do mito da caverna foi apresentada no filme Matrix, no qual um computador gera ilusões que povoam a mente das pessoas, que vivem ligadas a tubos dentro de cápsulas fechadas, reduzidas a componentes de uma imensa fábrica biológica. A mera revelação do mito não é suficiente para nos libertar das sombras que povoam nossa ignorância e nos transformam e utensílios, objetos manipulados independentemente de sua própria vontade. O processo que liberta o ser humano das sombras é a educação, que deve ser entendida como despertar e transformação pessoal, não como absorção de conteúdos programados como considera o nosso sistema de ensino. O estado desperto implica na percepção da realidade imediata e na abertura para aprender novos conceitos, novas relações, novos comportamentos. Implica em ser capaz de ver e julgar por si mesmo. Uma pessoa não passa de uma só vez e definitivamente do estado adormecido para o acordado, da cegueira para a visão. É preciso despertar gradualmente de cada uma de nossas ilusões e é preciso cuidar permanentemente para permanecer no estado desperto. Uma visão moderna da vida intelectual e do conhecimento como fenômeno orgânico foi desnvolvida por Boulding em seu genial ensaio. A quinta disciplina |